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sábado, 22 de fevereiro de 2020

Interlúdio 📺 ✒📃






Nó na garganta


Tenho algo a dizer
que muitos não teriam ouvidos para ouvir
e se assim o fizessem, não seriam mais os mesmos surdos
Pra que esconder as palavras verdadeiras na garganta?
Se o que nos resta é gritar
tentando encontrar a esperança

💙



Intervalo


Esse é meu interlúdio
Coisas acontecem nesse estado anormal
Basta ligar a TV
Basta folhar o jornal
As notícias não são corriqueiras
As notícias são verdadeiras
Policiais metralhando civis inocentes
Homens bomba explodindo no oriente
Amazônia devastada
A fome nos países mais pobres
A pedra de crack vendida por 5  reais
Recém nascidos morrendo em hospitais
Mais um craque de futebol vendido por 100 milhões de dólares
Mais um avião caiu
Mais um vulcão entrou em erupção
São tempos difíceis
Tempos sem boas previsões
Até quando?


💙



A grande verdade


Nervoso eu?
E porque motivo estaria nervoso?
Se no meu país não há miséria
ninguém mais morre de fome ou de tristeza
as doenças estão todas erradicadas
nem dengue, nem malária, nem chagas, nem varíola, nem febre tifóide, existe mais, e as crianças não são mais desnutridas nem desamparadas. 
Os governantes respeitam a pátria
exercendo a política de uma maneira jamais vista
muitos políticos abrem mão de seus salários
para suprir as necessidades do povo.
Que exemplo!!!
Bala perdida?
Só se explodir uma loja de doces na esquina
E o ensino? O que é o ensino deste país?
Até os europeus querem estudar aqui
realmente este é o país do futuro
Não senhores!!!!
Acho que estão enganados
não tenho nenhum motivo para estar nervoso
muito menos irritado
se estivesse trocando as palavras
ou contando mentiras
ficaria enrubescido
pois quando estou mentindo
Eu escrevo errato


💙


Remanescentes de uma terra sem dó


Ele empilha mais um saco nas costas
e segue em frente
Com ele vai junto a Esperança
Ele junta mais uma latinha no chão
e segue em frente
Com ele vai junto a Esperança
Ele dobra mais um papelão no meio da rua
e segue em frente
Com ele vai junto a Esperança
Ele cata algumas comidas no lixo
e segue em frente
Com ele vai junto a Esperança
Esperança, grávida de nove meses, então lhe sorri
enxuga sua testa, e segue em frente
De braços dados com ele.


💙



O que não queremos ver?


Um beijo sem desejo
Amor sem movimento
O que pode ser?

Um choro no silêncio
Um grito de desespero
O que pode ser?

Um livro sem palavras
Uma cabeça vazia
O que pode ser?

Um corpo com doença
Um olhar em decadência
O que pode ser?

Um louco suicida
Um dedo na ferida
O que pode ser?

Um cão abandonado
Um mendigo embriagado
O que pode ser?

Uma criança espancada
Um tiro sem culatra
O que pode ser?

O tempo sem preguiça
Um cego equilibrista
O que pode ser?

A fome na barriga
As pedras na garganta
O que pode ser?

Um índio sem casa
Uma mata sem árvore
O que pode ser ?

Um caso sem justiça
Uma justiça sem causa
O que pode ser ?

Uma água sem poço
Um poço sem água
O que pode ser?

O que não queremos ver?


💙


Se vira Maria


Os pés rachados de terra
ensolarados na casa de barro
são seis bocas famintas
e uma panela vazia
Se vira Maria

O mais novo tá desnutrido
o mais velho desanimado
a do meio barriguda
do terceiro filho bastardo
Se vira Maria

A comida acabou
teu marido foi embora
ainda não veio a bolsa família
vem chegando mais uma cria
é mais um olhar sem vida?
Se vira Maria


💙





Cor predominante


Um lápis colorido pinta o céu de azul
mas a única cor que predomina é o cinza
Garrafas vazias refletem um sol incolor
mas a única cor que predomina é o cinza
Um olhar solitário atravessa uma esquina
em busca de um amor
mas a única cor que predomina é o cinza
Um menino faz malabares com bolas de meia
no sinal vermelho
mas a única cor que predomina é o cinza
Um bêbado atropela uma mulher grávida
na avenida.
Todo mundo se reúne para assistir
A única cor que predomina é o cinza


💙



Paixão nacional


Futebol, bunda e carnaval
Êta paixão nacional




💙



Herança lusófona


Não preciso de carro importado, de luxos
nem de alegorias
Me basta as coisas simples da vida
O que fica além do pó?
Bem, ao menos deixarei minha poesia


💙




Escondido entre linhas


Aonde será que está? Será que
Morreu? Será que o
Odio venceu? Teria sido esta, a
Razão do desaparecimento?


💙



Pequenos pedaços


Não são tão pequenos os meus lamentos
tudo que sinto quando me lembro
mas não importa
vou abrir a porta
e seguir sem medo
Tudo o que vejo nesse espelho
são fragmentos de um ser imperfeito
mas não importa
vou abrir a porta
e seguir sem medo
Rupturas se abrem dentro do meu peito
ao lembrar do beijo, daquele beijo
mas não importa
vou abrir a porta
e seguir sem medo
Sei que sonhos se completam em pequenos pedaços
um dia você estará de novo em meus braços
sonhos se completam em pequenos pedaços
em pequenos pedaços
pequenos pedaços


💙



Brazuca


O meu samba é na caixinha
ninguém tem nada com isso
O meu samba é de primeira
esse é meu compromisso
Não preciso de pandeiro
nem de couro de cabrito
pra fazer o meu batuque
isso é tudo que eu preciso
uma caixinha
quadradinha
pequeninha
animadinha

O meu samba é na caixinha
agora o bicho vai pegar

Vai logo abrindo essa rodinha
deixa meu samba entrar
com o som da minha caixinha
Todo mundo vai sambar
rebola
se quebra
sacudi
remexê

O meu samba é na caixinha
agora o bicho vai comer

Sou brazuca
tô na luta
sô trabalhador
deixa eu curti meu samba
pra esquecer a minha dor
quem não samba?
quem nunca sambou?
Até majestade nosso samba já 
sambou Don João
sambou Don Pedro imperador

O meu samba é na caixinha
vou mostrar o meu valor

Sou brazuca
tô na área
o meu samba é animal
estremece o mundo todo
Igual meu futebol
bom de bola
bom de trova
bom de foda
Esse é meu carnaval

O meu samba é na caixinha
ninguém tem nada com isso
O meu samba é de primeira
esse é meu compromisso.



💙


Barreiras invisíveis


Paralelas que se cruzam
Involuntariamente
Cortam ruas
Rasgam túneis
Involuntariamente
Atravessam solitárias
Entre barreiras de gente


💙



Quintânes

O teu coração não me engana
Se eu fosse o Mario Quintana
você por mim passaria
ou passará, ou passarinha, sei lá
Um dia vou te encontrar
e no teu ninho escondido
na árvore de amor sortido
vou fazer você voar

💙




Vícios modernos


Meus olhos vidrados se distraem na tela de plasma
Sonhos virtuais produzem alucinações estáticas
Em cada tecla um cume digitado
Vidas sem vida, vícios digitalizados
Undergrounds e sons metalizados.


💙


Paralógica


Para quedas para raios
nas quebradas das palavras
para isso, paraíso
e para as ninfas, para médicos.


💙



Vaga-lume


ACENDE, ACENDE, ACENDE, ACENDE, ACENDE, ACENDE, APAGA, APAGA, APAGA, APAGA, APAGA, ACENDE, APAGA, ACENDE, APAGA, ACENDE APAGA


💙




A matéria que Nellie Bly gostaria de ter feito


Ingrid se liberta
Sai da armadilha
Mãos livres em fim
Dão fim a guerrilha
Liberté !


💙



Ei cara!


Ei cara!
olha pra minha cara
vê se eu tenho cara de otário
Todo engomadinho
lambidinho
bonitinho
Acha que eu tô aqui pra engraxar o teu sapato?
Ei cara!
olha pra minha cara
vê se eu tenho cara de otário

Qualé meu irmão
deixa de frescura
pra que tu atravessar a rua?
É por causa da minha cor?
Do meu cabelo?
Da minha roupa?
Do meu jeito?
O que que te incomoda?
Pra que essa cara torta?
Ei cara!
olha pra minha cara
vê se eu tenho cara de otário

Se eu tô com meu beck
é pra fazer fumaça
só pra relaxar
tirar essa ressaca
Ai no teu paletó
tem pó
e não e caspa
Então deixa de frescura meu irmão
Atravessar a rua
não vai mudar a situação
Me encara de frente
na tangente
na contramão
Se liga ai playboy
eu não sou ladrão

Ei cara!
olha pra minha cara
vê se eu tenho cara de otário
Todo engomadinho
lambidinho
bonitinho
Acha que eu tô aqui pra engraxar o teu sapato?

Ei cara!
olha pra minha cara
vê se eu tenho cara de otário


💙



Para quem gosta de coisas reais

As coisas reais não são fáceis de ingerir
quando saltam aos olhos
na frente do nariz
A realidade é amarga
que nem um gole de café
tomado de madrugada
depois de um trago de cachaça


💙



Carcará robotizado


Voa carcará
com teu olho de robô
vai circulando, ou como diria
o Caetano
circulandô

Voa carcará
por cima da cabeça
do Cristo redentor
vigia todo mundo
com teu olho de robô

Vai lá na favela
registrar mais uma chacina
grava tudo lá de cima
com teu olho de robô

Vai lá pra Brasília
acabar com essa folia
vai filma eles tudo
com teu olho de robô

Vai lá pro nordeste
vigia cabra da peste
que por lá se amocambo

vai por cima dos presídios
por cima dos terraços
e até no elevador

Voa carcará
com teu olho de robô

vai circulando, ou como diria
o Caetano
circulandô


💙


Sinceras Desculpas


Peço desculpas a estes mortais sem almas, que por não terem olhos, ofuscam a visão alheia, e usam suas línguas felinas para ferirem a integridade da genialidade criativa, e o caráter das pessoas boas.
Peço desculpas a estes canalhas,  corruptos e sexistas, que mesmo tendo sapatos, arrastam os pés no chão, propagando suas imundícies, deixando no ar um aroma fétido.
Peço desculpas a estes mortos despedaçados, que por não terem carne nos ossos, regurgitam um vômito tépido, envernizando seus corpos cadavéricos.
Peço desculpas a estes porcos, que por não terem pescoço, andam com a fuça no chão, e se deleitam num mar de merda e hipocrisia.
A estes hipócritas, a estes medíocres, minhas mais sinceras desculpas, e fodam - se todos os maus de espírito.


💙



O gaúcho, o carioca, o paulista, o nordestino, e uma gostosa


Barbaridade!!! Que potranca Tchê!!

Gossssssssssssssssssssssssstosa!!

Que mina boa meu!!!

Vixe Nossasenhora!!!



💙



Tudo o que você precisa


Tudo o que você precisa
é de um beijo
para matar esse desejo

Tudo o que você precisa
é de uma paixão
para acalmar esse coração

Tudo o que você precisa
é de um pouco mais de vida
para sair da solidão


💙



As lágrimas de Quintana


Jorge Amado amou
e foi imortal

Suassuna criou
e é imortal

Quintana chorou
por não ser imortal


💙


Novos coletivos


Coletivos
cheios de
gente

Carro
de boi
moderno

Ao invés
do cheiro
de bosta

Cheiro de cús
no acento



💙



Desconecta


Desliga teu celular
Fecha teu not book
Desconecta teu ipod
vê até onde tu pode ir
Dá um tempo pra essas
tuas quinquilharias
Vai caminhar de pés descalços
na beira da praia
Vai ver o sol nascer
Ouvir a canção do vento
Vai ler um bom livro
exercitar o pensamento
Vai respirar ar puro
Vai beijar na boca
Vai correr pelado
Vai dormir um dia inteiro
Vai ficar acordado
Vai no cinema
Vai no teatro
Pinta o sete
Faz o quatro
Deixa um pouco
de lado teus brinquedos
plugados

Desconecta !!!


💙



Adriana


Deixa o tempo passar
Deixa a Adriana cantar
No teu ouvido
Uma linda canção
No ar vai soprar
A poesia
De um belo
Som ao vivo
Fados
Casos
Amores
Discos arranhados
Telas
Pactos
Sabores
Corações despedaçados
Deixa a Adriana cantar
Deixa a Adriana tocar
O teu sentido
Deixa a Adriana dançar
Deixa a Adriana te amar
Deixa a Adriana Calcanhotar
No teu ouvido


💙



Se eu amasse você


Se eu escrevesse você
escreveria Neruda
Se eu falasse ao coração
falaria Platão
Se eu pintasse você
pintaria Frieda Kahlo
Se eu estivesse junto a ti
nunca mais sairia do teu lado


💙


Simples fatos


Uma boa trova
Uma boa foda
Despertar ao seu lado
No café da manhã
Isso me causa boas sensações
Fatos que simplificam
O acaso
Motivos motivados
Pela paixão
Simplesmente te amo
Na amplidão da palavra

Amor

Como é bom estar contigo
Sem o compromisso
De prorrogar
O verão


💙


Coração de robô


Rasgo meu peito e coloco pra fora meu coração robotizado
Enferrujado, sem óleo, sem rancor
Mecanicamente programado para não sentir dor
Avalio os batimentos cardíacos com a ajuda do computador
Sinto, revelo e machuco
Com ondas de choque, procuro
Ressuscitar o que já se foi
Os sentimentos que pulsam junto com os desejos
Dilatando as artérias
Do lado esquerdo deste peito mecânico
Programado para viver, quem sabe mais alguns anos
E cumprir a promessa de ser feliz
Será que será cumprida? Ou foi programado para ser assim?
Toco o vento com minhas mãos de chumbo
E admiro a vista com meus olhos fluorescentes
Olhares decadentes que se perdem no horizonte esquecido
E o amor que vejo e que sinto
Batendo no peito de um robô entristecido
Será simplesmente um impulso elétrico
Bombeando elétrons nas artérias de vidro


💙



Extremo Sul


Eu sou o sol você o mar
Eu sou o beija-flor você a flor que irei beijar

Eu sou o apaixonado você minha paixão
Eu sou a flecha você o coração

Eu sou o vinho você o pão
Eu sou o sentido você a razão

Eu sou a crença você a fé
Eu sou o homem você a mulher

Eu sou a brecha você a luz
Eu sou o guia você conduz

Eu sou a música você o som
Eu sou a cor você o tom

Eu sou o fogo você o vulcão
Eu sou o poeta você a inspiração

Eu sou a vontade você o beijo
Eu sou o amor você o desejo

Eu sou o brio você a coragem
Eu sou o sangue você a linhagem

Eu sou o braço você a mão
Eu sou o universo você a expansão

Eu sou a esperança você a cura
Eu sou a linha você costura

Eu sou a palavra você a dicção
Eu sou a resposta você a explicação

Eu sou a abelha você o mel
Eu sou a terra você o céu

Eu sou o cristalino você a transparência
Eu sou o perfume você a essência

Eu sou a árvore você a raiz
Eu sou o “quero” você me quis

Eu sou a magia você a sedução
Eu sou o motivo você a emoção

Eu sou o plebeu você a princesa
Eu sou o nobre você a nobreza

Eu sou o suspiro você a vida
Eu sou São Jorge você Aparecida

Eu sou a batalha você a vitória
Eu sou o fato você a historia

Eu sou o casamento você a comunhão
Eu sou a reza você a oração

Eu sou o traço você o destino
Eu sou o passo você o caminho

Eu sou a busca você a procura
Eu sou a promessa você a jura

Eu sou a chuva você o vento
Eu sou o carinho você o sentimento

Eu sou o abraço você a saudade
Eu sou a virtude você a verdade

Eu sou o absoluto você o existente
Eu sou o corpo você presente

Eu sou a espada você o samurai
Eu falo tchê você diz uai

Eu sou o olhar você a visão
Eu sou o amor no teu coração

Eu sou o tudo você o mais
Eu sou o extremo sul e você minas gerais...


💙



O tempo sem pressa


Não me pergunte que horas são
mas me diga, que oração devo fazer
para que o tempo passe mais devagar
para que a vida ande em câmera lenta
para que todos os bons momentos
passem bem devagarzinho
como um barquinho
deslizando lentamente no mar
Me diga que oração devo fazer
Para que meus olhos não ceguem
para que meu corpo não pare
para que as coisas melhorem
para que o tempo não passe
sem antes eu amar tudo que queira
sem antes eu sonhar tudo que deva
sem antes eu viver uma vida inteira
me diga que oração devo fazer
Para que eu consiga realizar tudo
que gostaria
para que eu consiga vencer
os obstáculos, as armadilhas
para que eu possa ver os filhos
dos filhos da minha filha
para que eu possa envelhecer
ao lado do meu amor
e ainda poder dizer eu te amo
sem se importar com as rugas no rosto e
os cabelos brancos
A vida é passageira para quem tem pressa
Eu não tenho, quero que ela passe
bem devagarzinho
como um barquinho deslizando lentamente no mar
Então não me pergunte que horas são
me diga que oração devo fazer
para que o tempo passe bem devagar


💙



O andarilho da terra do fogo 🌅 ✒📃



Codinome Lampião


O meu nome é Virgulino
O lagarto nordestino
Ouça bem o que lhe digo
O cangaço é meu quintal
Meu sobrenome é perigo
Vai logo me dando essas moedas
Vai logo rezando á padre Ciço

Foi com Antônio e Levino
Com meus irmãos eu aprendi
Que no cangaço o homem
Tem que ser macho
No cangaço o homem
Não pode dormir

Leão valente e cangaceiro
Macho de todas as maneiras
Foi assim que eu me apresentei
Na tropa do sinhô Pereira

Vendo o sofrimento de meu povo
Nas mãos do crime eu cai
Na casa da baronesa
De água branca eu bebi

Peguei o bicho pelo pescoço
Prendi Antônio Gurgel
Um frio na espinha desceu pelas costas
Me gelando a boca do céu

Numa agonia de dá dó
Foi dois de uma vez só
Perdi Colchete e Jararaca
Na invasão á Mossoró

O calango escondido
Não aceitou a derrota
Mas tive que esperar
Pois Pernambuco, Paraíba
E Ceará, estavam á me caçar

Atravessei o São Francisco
Com cinco cabras na mão
E foi lá na Bahia
Que eu me levantei do chão

Um certo dia escondido
Na fazenda de um coiteiro
Foi lá que encontrei
Meu amor verdadeiro
Só tinha um problema
Era a mulher do sapateiro

Fugiu comigo em nome desse amor
Enchendo meu coração de alegria
Maria Déia, cheia de ideia
Flor nordestina

Na caatinga
Debaixo de um umbuzeiro
Nasceu minha filha Expedita
Lindo anjo vindo do céu
Á iluminar minha vida

Com minhas roupas de Napoleão
Feitas pelas minhas mãos de artesão
Apresentei meu bando e minhas cartucheiras
Ás lentes de Abrão

O meu olho que vazava
Dr: Bragança arrancou
Confesso tive medo
Mas não senti nenhuma dor

Meu destino tava chegando
Senti meu peito sangrar
João Bezerra e Aniceto Rodrigues
Vieram me atocaia

Vi cai Quinta-feira
Vi cai Mergulhão
Vi cai Enedina
De joelho no chão

Vi Moeda e Alecrim
No rabo do foguete
Vi cai Macela
Vi cai Colchete

Antes de dar meu último suspiro
Pensei no meu amor
Onde tá Maria Bonita?
Minha amada
Minha flor

Fui Virgulino Ferreira da Silva
Codinome Lampião
Vivi, amei, e morri
Nos braços do Sertão

Se fui herói ou bandido
Deixo aqui esta questão
Mas quem luta por igualdade
Merece consideração



💙


Confusão no céu


Vai tocando essa prosa
Nessa linha de cordel
Vô te dá uma prova
Que essa prosa veio do céu

São Benedito escreveu
Com a pena de São joão
Quase que o pau comeu
Quase que deu confusão

São Pedro veio apartar
Antes que o pior acontecesse
São Benedito ia apanhar
Ia levar um cacete

A pena era de ouro
São João ganhou de Nossa Senhora
Pra ele era o maior tesouro
Com ela que ele escrevia suas prosa

São Benedito pegou emprestado sem pedir
Foi ai que se deu o mau entendido
São João ficou desesperado
Foi procurar até o santo Expedito

Passou três dias, uma semana
Ninguém achou a tal da pena
São João tava furioso
Não queria nem mais fazer fogueira

Jesus Cristo apareceu
E reuniu todos os santos
Quem pegou a pena do João?
Quem pegou levanta a mão

São Jorge montado no cavalo
Aponto com a lança
Olha ali o Benedito
Tá chorando que nem uma criança

Jesus Cristo então perguntou
Foi tu Benedito?
Que pegou
Sim, fui eu meu senhor

Só peguei emprestado um pouquinho
Achei que não ia ter problema
Só queria escrever uns verso
Só queria fazer um poema

Pra entregar pra Nossa Senhora
Dar pra ela de presente
Ela é tão bondosa
Queria deixar ela contente

Cuida de todo mundo na terra
Não tem tempo pra descansar
Só queria agradar ela
Só queria lhe presentear

Com uns verso bem bonito
Numas linha de cordel
Mas João ficou enfurecido
Óia a confusão que deu no céu

João meio sem jeito
Foi logo pedindo desculpa
Desculpa Benedito
Foi tudo minha culpa

Tô nervoso porque meu dia tá chegando
Ainda não fiz nem um cordel
Meus devotos já tão me chamando
Cumé que eu vou descer aqui do céu

Não te preocupa João
Eu posso te ajudar
Já terminei o poema de Nossa Senhora
Só me falta declama

Jesus Cristo então disse:
Bom! Tá tudo resolvido
Agora vamos voltar pro trabalho
Temos um monte de serviço

Vem cá Benedito
Não sabia que tu gostava de escrever
Toma aqui essa pena
Que eu ganhei quando ainda era nenê

Ganhei de um dos reis magos
Quando nasci lá em Belém
Agora ela é tua
Escrevi pra mim também

Ô, meu senhor
Não precisa nem pedir
Que presente mais bonito
Hoje não vô nem dormir

Amanha bem cedinho
Vou lhe escrever um cordel
Agora vou ajudar João
Á iluminar esse céu

O dia dele tá chegando
A festança vai começar
Lá em baixo já tá todo mundo festejando
Esperando nóis chega


💙



Che Guevara do Sertão


No nordeste tinha um cabra
que não era mole não
comia todas as mulheres rendeiras
e mordia escorpião
Esse cabra era valente
tinha sangue de serpente
e rugido de leão
Ele brigou com muita gente
mais salvo uns inocente
no meio da confusão
Para uns era bandido
para outros era mocinho
Era um cabra destemido
muitos até diziam
que ele não tinha coração
Teve só um amor nessa vida
uma linda menina chamada
Maria bonita
sua grande paixão
Pra quem não conhece
sua estória, o nome dele
é Lampião
Era o rei do cangaço
o lagarto nordestino
o Che Guevara do sertão.


💙



Oráculo dos tigres


As patas dos tigres sangraram
Impregnando de sangue a terra vermelha
Enquanto o vento soprava no sertão seco
E o sol rachava no meio da cabeça
Da-me um pouco de água, tu que nunca choraste
Se a lágrima não fosse salgada eu bebia
Matava minha sede com a dor da minha agonia
Não tenho água pra beber!
Nem esperança para esperar
Desde criança meus pés fritam neste chão ardido
Minhas sementes não crescem
Minha cabra não dá leite
Fico aqui observando os urubus
Que esperam ansiosamente a hora de me devorar
No sertão não existe paraíso
No sertão só existe a dor
É como um templo sem igreja
E ovelhas sem pastor
Segui a sina nordestina
De morrer com os olhos secos de sol
Ou seriam de mar?
Depois de tanto chorar
Depois de tanto sofrer
Quero um pouco de água pra beber
Quero um pouco de vida pra viver


💙


A morte do Coringa


“Todos choram em Gotham City
A morte do Coringa
Não!!!! Não foi o Batman que o matou!
Ele morreu de overdose!”

O mamulengo do Coringa cai desfalecido
enquanto Vicentino fecha as cortinas
de seu pequeno teatro de bonecos.

E assim, mais um espetáculo chega
ao fim na Paraíba.


💙



Mente aberta


Da minha cachola
Saltam as palavras
Plurais, adjetivos
Silabas cifradas
Cordões e rompimentos
De frases alinhadas
O meu verbo eu mesmo faço
Como cordéis espalhados numa praça
Canto, rezo e confesso
O som arranhado que sai da minha garganta
E os pensamentos girando
Na mente aberta
Voam planos até o horizonte
Como nuvens carregadas
Espalhando idéias sobre o firmamento


💙



Invisível


Um beijo amargo de fel
Uma noite e meia no céu
Te fariam cair em meus braços
Uma dádiva
Um doce momento seria
Ficar guardado em teus beijos
Mergulhado de todas as maneiras
Dentro do teu âmago e desejo
Uma noite inteira e faria
Amor em teu sentimento
Meus olhos são tristes
Por te ver assim tão
Apagada
Talvez fosse a dor da solidão
A machucar-te
Por não ser amada
Talvez fosse a dor por
Amar demais
Sem ser recompensada
Sou como um sol brilhante
A ofuscar tuas vistas
Talvez por isso
Não me vês
Talvez por isso
Eu insista.



💙




Remanescência estrangeira


Eu vi estrelas de Davi se desprendendo de camisas listadas
Em um campo de concentração
Eu vi mulheres alemãs serem estrupadas por heróis covardes
Sem nenhuma razão
Eu vi o ditador sujar as calças, com medo da merda que fez
Eu vi meninos ficarem paraplégicos, depois de alimentarem a boca do dragão
E um homem branco com o cérebro espalhado no capô de um carro
Atingido por um tiro que ninguém sabe de onde veio
Eu vi as torres caindo no meio do centro
E todo mundo entrando em desespero
Eu vi o tirano ser enforcado com os olhos impregnados de orgulho
E o terrorista escondido no pátio do estrangeiro
Depois disso não vi mais nada, tudo ficou escuro
Mas agora, aos poucos estou recuperando a visão
Vejo soldados voltando para casa
E um homem azul acenando no meio da multidão
Ele traz na face um semblante tranqüilo
E segura um livro em uma das mãos.


💙


Tabuleiro do destino


Tu podes chegar no topo da montanha mais alta
Mas mesmo assim, não serás maior do que eu
Tu podes chegar até os céus
Mas mesmo assim, não terá asas para voar assim como eu
Tu podes ser o xerife, o super herói, o supremo
E nem mesmo assim, chegará aos meus pés
O que é um pequeno tijolo perto da muralha da China?
Ou a chama de um esqueiro perto do sol?
Teu espírito é pobre como tua visão limitada
De que adianta ter tudo?
Se não tem coragem de lançar o arpão
Tu és apenas um moribundo
Uma casca vistosa de uma laranja podre á vagar pelo mundo
O mundinho que criaste
O perdedor é aquele que perde achando que está ganhando
O burro que coloca a venda nos olhos e vive se enganando
Esse ai é tu, que comparado a mim, é apenas um monte
De bosta boiando em um açude fétido
Vê se não me enxerga
E te enxerga
Vai viver no teu mundinho de intrigas
Ao invés de tentar viver o meu
O ódio cega
A inveja mata
Mas o fracasso que se sente por ser um nada
É bem pior
Por tanto!
Viva tua vida! Por mais medíocre que ela seja.


Disse deus ao diabo, depois de perder uma partida de xadrez


💙



A trilha dos vedas


Eu sigo as velhas trilhas
Deixadas pelos antigos vedas
Minha vasilha segue
Pelo lado contrário do rio
No meu dicionário védico
Trago o significado do amor
E o sentido do fio
Que conecta e desconecta
A sinapses das vértebras
O pensamento alfa
Que transcodifica a palavra certa
Um sentimento único
Os seis braços de um semi-deus
Golpeiam com uma só espada
Estancando o veneno de Shiva
Enquanto o bodisatva caminha
Com patas de Gajendra
E o crocodilo lhe suga a vida
Com uma única mordida
Violenta


💙




Horas surreais


Os vidros se estilhação em um chão nervoso
E vão ao encontro dos outros cacos vazios
Espalhados pela rua imunda, onde postes viciados
E lâmpadas bêbadas regurgitam a noite junto
Com suas ânsias profundas
Uma velha coloca a bunda pra fora da janela
Enquanto vaga-lumes vagabundos iluminam as ruelas
Com seus rabos iluminados
Um relógio derrete na parede
Dissolvendo as horas mortais
Enquanto Salvador Dalí enfia o dedo dentro de
Um pote de geléia de morango

Corre horas putas como um vento infernal
Levando as vassouras das bruxas de volta ao mundo surreal
Correm póstumas notas de um poema já esquecido
Com versos loucos e furiosos gravados em um pergaminho

- Vai velha ! Tira essa bunda da janela!
O minuano tá soprando.
Olha lá o laçador em cima do camelo!

Corre horas putas, nos digitais e nos ponteiros


💙



Portas escritas


Minhas calças curtas
De travessuras, de caçadas
E aventuras, Monteiro Lobato
Minha filosofia Suassuna
E meus olhos cegos, Saramago
Nas minhas borboletas mortas, Baudelaire
Na minha angustia, Florbela Espanca
Uma rosa sem perfume
E em sua dor, Augusto dos anjos
Beija sem ciúmes
Um beijo tépido no silêncio
Mortes, chagas, visões, infernos de Dante
Minhas mãos Machadianas escrevem versos de Quintana
Em uma ensolarada tarde, e as horas passam, voam
Ninguém vê Virginia Woolf
E Drummond com cara de bom, olhando o céu ao lado de Bandeira
De bobeira, soltando pipas no ar, sentados na areia
Na Villa dos lobos, um Tom toca Vinícius
Eça de Queiroz iça seus anzóis com palavras de ternura
Usando toques de Neruda
Eu ando pela Baker street mas não encontro Conan Doyle
Nem Jô Soares, e na corrida do ouro, Allan Poe corre
Apressado com os corvos enquanto Mary Shelley tranca seu monstro no armário
No corredor, Crowley vê Levi, e Bram Stoker carrega um bebê vampiro nos braços
Fernando pessoa visita o salão filosófico de Platão
Enquanto meus olhos de Byron naufragam num mar revolto


💙



Memórias de um putanheiro


Havia se passado uns dez anos, e Kaciandro ainda trazia
Em sua memória os momentos que tinha vivido na “boca da tigresa”
Uma boate beira de estrada que ficava lá pros lado de Goiás.
Por um súbito instante, parou o opala preto ano 77, com rodas cromadas
No acostamento, e disse ao amigo:

Nunca mais eu fui naquele puteiro
Nunca mais eu fui naquele lugar
Onde deixei um grande amor
Que até hoje está á me esperar
Quando olhei dentro daqueles olhos verdes
Eu juro, eu não queria me apaixonar
Pra ela eu era só mais um cliente
Eu não podia me enganar
Do seu nome eu não me lembro
Mas uma coisa vou confessar
Ela me ensinou todos os segredos
Com ela eu aprendi a amar....


Após o desabafo, Kaciandro pisou fundo no acelerador
E seguiu pela estradinha de chão batido, curtindo bem
Alto o som do Waldik Soriano



💙


Dois padres e uma garrafa de vinho


Já haviam quase secado uma garrafa de vinho
quando frei Joaquim  levantou meio em câmera lenta
Um soluço veio-lhe ao peito, e as pernas bambas
fizeram-no bater o dedão que estava pra fora da sandália
com toda a força no pé da mesa

- Cacete do demônio!!! Gritou o frei Joaquim

Após alguns segundos, veio a gargalhada simultânea
dos dois padres.

- E eu lá sabia que o diabo tinha cacete.
Disse frei João, chorando de rir

Começou-se ali então uma brincadeira, e ambos desafiaram-se em busca do adjetivo
perfeito.


- Pingola do bicho marola! Disse frei Joaquim

- Sarrafo do maligno! Disse frei João

- Xonga do mestre das sombras! Disse frei Joaquim

- Vara do chupa-cabra! Disse frei João

- Pirulito do mequetrefe ! Disse frei Joaquim

- Pisa do bicho que agita! Disse frei João

- Salame do maldito! Disse frei Joaquim

- Baquete das trevas! Disse frei João

- Poste do bicho da morte! Disse frei Joaquim

- Espiga do demo! Disse frei João

- Varão do cramulhão! Disse frei Joaquim

- Tora do bicho que te atocha! Disse frei João

- Lingüiça do bicho preguiça! Disse frei Joaquim

- Cana do bicho sacana! Disse frei João

- Bilau do mal! Disse frei Joaquim

- Pica maldita! Disse frei João

- Corneta do capeta! Disse frei Joaquim

-Obelisco do cão! Disse frei João

Os dois padres deram barrigadas de tanto rir, frei João então disse:

- Vai mais uma garrafa de vinho ai Joaquim?

- Tá bom! Só mais essa! Depois vamos dormir! Amanha temos que estar cedo na missa.


💙




Bigorna atômica



Abigornado, afetado, transtornado, abestado, malucado
Chacoalhado, indignado, atocaiado, batucado, extirpado
Flagelado, complicado, estuprado, bestaiado, empipocado
Preocupado, envergonhado, acanhado, agachado, desanimado
Enrolado, asfixiado, impressionado, amolado, assombrado
Desfigurado, emparedado, esmagado, achatado, afogado
Desorientado, alienado, acovardado, retardado, aprisionado
Acorrentado, desmaiado, subjugado, ajoelhado, humilhado
Desempregado, desmiolado, injuriado, irritado, desacordado
Abortado, martelado, desgraçado, apressado, afundado
Necessitado, embriagado, desmaiado, rejeitado, enferrujado
Desprezado, violado, atormentado, descartado, injustiçado
Envenenado, martirizado, deformado, escravizado, torturado
Castigado, desconfiado, incinerado, atropelado, pendurado
Invocado, maconhado, aperreado, massacrado, perturbado
Paralisado, inchado, arranhado, machucado, escorraçado
Acamado, operado, espancado, apavorado, depredado
Usurpado, anestesiado, drogado, fusiado, ambrosiado
Esfoliado, esformigado, esfoiçado, efumeado, mordomeado
Sorteado, monteado, aglutinado, esmanteado, todo cagado...

Foi assim que ele ficou depois de levar uma bigornada na cabeça.


💙



Pecados insólitos


Ela ajoelhou-se e rezou
Desfrutando as poucas horas
Que ainda lhe restavam
Aproveitou para chorar
Enquanto seu peito sangrava
Uma lágrima de turmalina
Entre seus dedos um rosário
Ia relembrando os abortos
Que fizera até ali

Logo, perdeu-se nas horas
Mergulhando num profundo pensamento
Atrasada, passou um batom encarnado
Nos lábios, soltou os cabelos, e tirou
O chambre rendado
Passou um perfume barato no pescoço e nas coxas
O decote do vestido vermelho salientava seus seios fartos

Enquanto ela se arrumava...

Um padre á espiava pelas frestas do confessionário
Ao entrar em exstasse, esvaiu-se num grito de gozo
Revelando-se a prostituta, que ao passar por ele
Abriu-lhe um largo sorriso, enquanto o pobre, ajoelhado
Limpava seu pecado com a batina



💙



Fortaleza


É assim que te vejo, fria
Como a lua entristecida
E de mim o que sobra?
Se não a falsa alegria
Mas não quero mais assim viver
Tamanha solidão em meu querer
O que antes se dominava, agora não se domina
E não mais o amor semeia
Com folhas ressequidas
E se põem a chorar
Além da despedida
O sonho é sempre um sonhar
E não sara a ferida

É assim que te vejo, bela
Como a rosa radiosa
Que chora com o orvalho
Tal como a aurora
De não mais amar
O que não se ata
De não mais transladar
O que não transmuta
E depois de tanta luta
Não mais lutar
O que se ganha em se perder?
O que se perde em se ganhar?

É assim que te vejo, crua
Sem direito a pergunta, sem sonho a sonhar
Um sonho denso, sem lenço, sem fúria
E o que são lágrimas derramadas?
Além de águas salgadas
lágrimas cristalizadas de um mar revolto
Um lamento de um coração a deriva, engolido pela tempestade
E a temperança? Talvez sem esperança
Lança-se sozinha como uma criança
Que cega, não se importa com o perigo
Não teme o castigo
Mas se põem a chorar um pranto sofrido

Transfere a busca ao espírito
De um sonho bom e não dormido
Na seiva de um peito adormecido, e o amor nele
Jaz sofrido, de não mais amar o referido
Sem cura, o que não se trata
Sem busca, o que não se procura
Transcende a luz ao crepúsculo
Quem dera fosse verdade
O amor encarnado, semeado na altura
Além do céu, a claridade
Além da duvida, a certeza
O amor nada mais é do que uma doce pergunta
Com resposta talvez ao coração dos amantes
Que amam infinitamente sem esperar nada em troca
E carentes, protegem-se, em uma frágil fortaleza


💙



Nobres anzóis


Com os olhos vendados eu posso ver
Minha carne pendurada em arpões
Como anzóis que brilham no escuro
Cortejando bocas de dragões
É um sofrer que castiga e que dói
Rasgando lentamente o que se foi
Quero o colo de minha mãe para me deitar
Quero o abraço de meu pai para me abraçar
Já que não tenho teus lábios
Tua boca
Tua língua louca
Para me beijar
Talvez eu desça desses arpões
E volte a andar
O que me espera depois?
Talvez um novo amor
Para amar



💙




Feras usurpadoras


Vespas furiosas me rodeiam
Me assombram
Me invadem
Me anseiam
Zumbindo
Zunindo
Malditas!!!
Atormentando meu pensamento
E o cristal no altar do altivo
Com a hóstia consagrada em seu riso
Ilumina o firmamento
Pairando
Voando
Pousando
Escrevendo com letras de ouro
Novos mandamentos
No nordeste o sol castiga
Os filhos da terra
Que choram águas espremidas
Com os olhos secos
Enquanto as abelhas malditas
Os rodeiam
Fazendo escorrer-lhes o mel dos dedos


💙




Canções de Navarone


Balas de canhões explodem nos céus
O barão de Münchhausen me mentiu
Quando disse que eram fogos de alegria
Como ter a liberdade
Sem antes sofrer na agonia?
Em todo clarão
Há um sorriso de Napoleão
Disse ele
Disse o barão
Não há céu sem estrelas
Não há terra sem chão
Não há sílaba sem palavra
Não há pecado sem perdão
Na agonia o homem mata e morre
Cresce e se liberta
Julga, culpa, e implora piedade
Corações que sangram na escuridão
O pranto no silêncio da razão
E os maquiavélicos canhões
Á explodirem nos céus
Com balas lançadas
Pelas nossas próprias mãos



💙




O palhaço equilibrista


Ando na corda bamba
Mas meu nariz de palhaço
Não me deixa cair
No picadeiro faço graça
Pra todo mundo rir
Sou apaixonado pela trapezista
Mas ela não me enxerga
Não me faz existir
Ama cegamente o mágico
Só porque o mágico
Não lhe deixa cair
O elefante vive trombando
Em mim
Acho que não vai
Muito com a minha cara
Só porque sou assim
Vivo sorrindo
Pra que atrair as coisas ruins?
Aqui no nordeste tudo é festa
Todas as crianças estão a sorrir
O leão Juba, não é mais Juba
Agora é Lampião
Vestiram de cangaceiro
O coitado do anão

Êta povo divertido
Nem perece que sofreu
Quando aqui não tinha circo



💙




O deslize da mulher rendeira


Os girassóis não giram mais
E as rosas não tem mais o mesmo perfume
Naquela cantiga de rodas
Eu senti ciúmes
Daquele outro rapaz
Que pegou em sua mão
E te olhou com outros olhos
Olhos de um olhar feroz

Abri as palmas das minhas mãos
E deixei cair a chuva
Com a esperança de fazer nascer
Um novo arco-íris
Mas só desencadeei mais
Tempestades e temporais
Porque sorriu para ele daquele jeito?
Porque fingiu que não me viu?
Eu estava ali
Olhando pra você
Te beijando em pensamento
Sufocando a dor
Contida em meu peito
Porque não quis mais saber de mim?
Eu te ensinei a amar
Mulher rendeira
Eu te ensinei a sorrir
Porque não quis mais o meu amor?
Em cada beijo nasce uma vida
Em cada sol nasce uma flor
Porque me deixou?
Porque?
Eu te ensinei a amar
Mulher rendeira
Mas você não me ensinou a te esquecer



💙


Jesus Cristo Nordestino


Veja minhas mãos pregadas na cruz
Veja o sangue que nelas escorre
E será todo em vão este sofrimento?
Em um berço bem pobre eu nasci
Numa terra castigada pelo sol
Terra seca que arde e castiga
Os filhos da dolorosa agonia
Que de sede e de fome
Morrem todos os dias
Cada qual com sua alegria
E de onde vem tanta força?
Das mão calejadas de esperança?
O tempo é cruel e condena
Os filhos da terra vermelha
De onde eu vim não tem chuva
O rio onde me batizei, secou
Não multipliquei pães
Para alimentar o meu povo
Mas dei-lhes perseverança
Ungiram meus pés com sândalo e jasmim
Minhas mãos também lavaram
Seus rostos, com a leveza de um serafim
Na minha terra eu era rei
Agora olhe pra mim
Pregado nesta cruz de pinho
Com uma coroa de espinhos
Chegando perto do fim
Minha dor não se compara
Com a dor de meu povo
Se pudesse, não duvide
Faria tudo de novo
Arrancaria de minha própria carne
Um pedaço de mim
Me jogaram pedras, me cuspiram
E as marcas das lâminas que me cortaram
Ainda latejam em meu corpo
Mas tal dor não se compara
Com a dor de meu povo
Que vivem na indiferença da ingratidão
No esquecimento e no abandono
Quando eu era menino
Eu lia Suassuna ao lado de minha mãe
Aparecida
Que hoje chora com meus irmãos
Nos pés de minha cruz adormecida
Não chore mais minha mãe

Vá dar de comer aos meus irmãos
Deixe-me ficar aqui no sertão
A ponta da lança faz sangrar o meu peito
Nesta terra seca não nasce nenhuma flor
Mas deixarei aqui plantado
De semente em semente
Até florescer o amor
Não chore mais, minha mãe
Enxuga tuas lágrimas com o
Vento que sopra em teu rosto
Vivi ao teu lado todos os dias
Da minha vida
E tu nunca deixou-me faltar nada
Quando nossas cabras morreram de fome
E o sertão parecia o inferno
Tirastes força não sei de onde
E sobrevivemos junto com os restos
Foi na terra de todos os santos
Que encontrei meu grande amor
“Na casa dos Budas ditosos”
Entreguei-me nos braços de Madalena
Amada morena-sereia
Que me fez caminhar sobre as águas
Talvez ela lhe escreva uma carta
Ela me espera nos lençóis do Maranhão
Carregando nosso filho no ventre
Mãe, imagino o que sentes
Ao ver teu filho em flagelos
Mas na altura em que meu espírito
Se encontra, não há dor
O sofrimento se transforma em esperança
Quando a fé é maior
Somos todos filhos do  mesmo pai
Mas a tempestade que agora cobre os céus
É uma lágrima que está prestes a cair de seu rosto
Dê graças a Deus, mãe
Hoje vai chover no sertão
Hoje tocará na caatinga uma nova canção
Vá embora mãe, não sofra tanto por mim
Deixe essa terra seca dormir
Nos braços desta noite sem fim
Que agora se aproxima de nós
Vá minha mãe, e reze á padre Cicero
A promessa se cumpriu
Não levo todos os pecados comigo
É impossível levar todos os pecados do mundo
Mas levo o sofrimento de nosso povo
Que a cada dia é castigado, e sofre
Nas mãos dos novos romanos

Aqueles que tem tudo
Quase sempre não tem nada
A felicidade não se compra
A felicidade é de graça
“ Para os bons de coração”
Que mesmo não tendo nada
Dividem o pouco que tem
É por estes que morro nesta cruz
Vale a pena morrer pelos bons
Um dia irão de lembrar deste acontecido
Sei que não serei esquecido neste mundo de Deus
Mãe? Quando eu morrer
Peça para João fazer uma fogueira bem grande
Quero que meu espírito chegue
As mãos do pai junto com uma ciranda
De uma cantiga de roda
Agora vá minha mãe
Hoje vai chover no sertão
Hoje na caatinga tocará uma nova canção
Hoje Severino, Jesus Cristo nordestino
Será elevado ao sagrado coração.

...E enquanto sua mãe chorava
Severino cantava, seu último lamento

“Quando oiei a terra ardendo
Com a fogueira de São João
Eu preguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação.......”


💙


Andarilho


O andarilho caminha pela trilha perdida
Nos confins de uma terra esquecida
Serpenteia serpentinas de serpentes imaculadas
Dá seus passos o andarilho
Continua sua jornada
Caminhando em cima dos grãos de milho
E a cana a verdejar nas paredes solitárias
De uma terra açucarada
Faz do andarilho, filho, joio e trigo
Com a bandana na cabeça
Segue o homem seu destino
Perigosa caminhada
Nas mãos calejadas
Leva as sementes
De uma terra devastada
Amargo fervor sentido
No coração de um andarilho
A terra dura te faz filho
Um filho incansável
Duro, forte, rígido, determinado
Segue o andarilho seus passos
Não importa a batalha
Segui com passos firmes
O andarilho
Até o final de sua jornada



💙



Promessa sertaneja


Se água na pedra fura
Onde tá o raio dá chuva?
A caatinga tá gritando
Já são seis meses de secura
Desse jeito não há quem aguente
O sol na cabeça perturba
Já fiz promessa pra São Pedro
Só me falta fazer macumba

Hoje no pastoril
Vou rezar á padre Ciço
Quem sabe ele manda
Um pouquinho de água
Só um pouquinho
Sem compromisso

Se caí água do céu
Prometo meu padinho
Ficar sem namorar três dias

Quer dizer... ficar só no beijinho


💙




Índia morena


Nas linhas que te revelam o texto perfeito, escrito pela tua beleza, realmente é um retrato da mais pura certeza.
Tu és linda e radiante, morena cravo e canela.
Onde a luz dos teus olhos na verdade são duas janelas.
Duas janelas do amor.
Tua cor é a cor do pecado, que por Deus foi perfeitamente pintado.
Onde na tua pele, linda morena, se esconde o amor encarnado.
Quisera eu poder beijar tuas mãos, assim como um beija-flor beija a rosa mais bela do serrado.
Quisera eu poder sentir o perfume que habita o teu corpo de morena tropical.
Linda mulher, fascínio total, tu és a maça do amor nas noites mágicas de são João Onde a doçura se transforma no mais doce desejo.
Tu és o luar do sertão enamorado, onde as estrelas brilham no coração dos apaixonados, onde todo o amor se faz ser encontrado.
Doce morena, peço a Deus que sempre te proteja e te ilumina.
E no meu coração abençoado por nossa senhora Aparecida, eu peço que um dia, possa estar diante de vossa beleza.
Então, assim como um violeiro apaixonado, alucinado pelas estrelas da noite iluminada, te entregarei meu coração, linda morena, doce amada.



💙



Galope dos anjos


Eu me deito sobre o solo
E escrevo palavras sentidas
Cortando com navalhas afiadas
As caras das minhas mentiras
Sinto o peso desta solidão
Que os cortes dos teus pulsos deixaram
Vi o visionário e o profeta
Disfarçados de Lampião
Seguirem a trilha brilhante
Com um galope de escorpião
E a terra á gemer
Com o calor do sertão
Fazia teu ventre arder
Na palma da minha mão
Enquanto tu choravas
Eu morria
Entre tuas coxas macias
Num único galope de paixão


💙



Visionário cantador


Com sua guitarra estratosférica
E seu grito cantador
Zé Ramalho segui o verso e a rima
Do iluminado encantador
Avôhai, padinho Ciço, nosso senhor
Abençoai o visionário
Que traz em seu dicionário
Palavras de um poeta cantor
Em sua mente tudo brilha
Quando os cometas se alinham
Se agrupam no seu som
Com seus mistérios e segredos
Desafia sem medo
A filosofia de qualquer doutor
Enquanto o olho cego vagueia
Procurando o matador
Ele saca sua espingarda
De seu alforje de caçador
E no céu tudo se ilumina
Com as luzes de um grã-vizir
Quando o poeta escrevi sua poesia
Espalhando magia
Sobre o chão de giz
É a semente de um poeta
De um visionário cantador
Que semeia no ventre da querubinas
Felinas, o amor
Das mulheres sabe os mistérios
E conhece toda a dor
Delas faz frevo, banquete e flor
Entre a serpente e a estrela
Ali está o grande mistério
Da vida e do amor
Segue a viajar pelo espaço
Com teu som e com teu poetar
Apanha na vila do sossego
Teu táxi lunar
Segue o verso e a rima
Do iluminado encantador
Pois essa é tua sina
É o que te fascina
O que te faz ser
O visionário cantador



💙



Tenda dos desejos


Bandeiras de São João dançam com o vento
Suspirando de desejo por aquela morena
Que dança em volta da fogueira
Com a pele banhada em água de cravo
No cabelo uma rosa vermelha
Os pés encantados, descalços
Os lábios grossos, levemente rosados
Saboreiam uma maça do amor
Sobem os balões em brasas
Queimando lentamente meu peito apaixonado
E os olhos negros dela
A sorrir com a ciranda em movimento
Paraliso com aquele sorriso
E o coração a bombear o desejo
Suspiro diante daquela beleza
Quisera eu sentir o seu beijo
Se eu fosse um beija-flor
Ou até mesmo um colibri
Beijaria aquela morena
Então explodiriam fogos nos céus
E uma cascata colorida iluminaria
O beijo nela que eu daria
Até o sol amanhecer
No sertão


💙



Minha guerra


 Minhas mãos estão machucadas
 Meu coração está sangrando nessa escuridão.
 Eu tento enxergar a esperança nesta guerra diante dos meus olhos
 A esperança sempre está nas sombras da escuridão mais profunda
 Eu vejo essas pobres pessoas solitárias vagando pelas ruas.
 Tentando encontrar esperança em todos os cantos
 Eles são como fantasmas de uma fotografia borrada
 Esquecido pelo tempo
 Quantos sonhos se perdem na noite, na decepção de um dia?
 Eu vejo mães lutando pelos filhos
 Eu vejo os corações chorando em silêncio
 Com lágrimas de sangue e dor
 Esta é uma guerra injusta para aqueles que não são capazes de lutar
 Onde estão os heróis do novo mundo?
 Onde estão as mãos para quebrar essas correntes?
 Se você andasse por todas as ruas do mundo, até onde você poderia ir?
 O que seus olhos veriam?
 O que seu coração sentiria?
 Você seria capaz de revelar a verdade?
 Você seria capaz de lutar por isso?
 Você só será capaz de abrir os olhos se for capaz de abrir o coração
 Você pode andar pelas ruas perigosas, mas nunca esteve na guerra
 Como você será capaz de lutar?
 Como você será capaz de derrotar o inimigo?
 Há uma guerra injusta aqui.
 Onde apenas os fortes são capazes de vencer
 Somente você pode decidir de que lado você está
 Sempre que fecho meus olhos e sinto as batidas do meu coração
 Agradeço por estar vivo.
 Então eu me pergunto o que posso fazer
 Tenho sangue nas veias
 Tenho ar nos pulmões
 Tenho pernas para andar e uma razão para seguir em frente
 Eu tenho mãos para tocar e escrever meus sentimentos
 Por que ficar parado, se o que nos move, é o que nos mantém vivos?
 É o que nos inspira
 Só seremos capazes de viver a vida se tivermos inspiração em nosso coração
 Se houver esperança em você, você pode trazer esperança para aqueles que não têm
 Se houvesse amor em todo coração, haveria mais esperança.
 Por que calar a boca, se você pode dizer a verdade?
 Esta é a minha guerra e, como toda guerra, é uma guerra injusta.


💙


O monólogo de um cavaleiro


Enquanto as árvores deixam cair suas folhas secas por sobre a tumba fria, um fantasma murmura em sua agonia. Em pé, diante de sua sepultura com sua fria armadura. Apenas um pássaro, uma árvore, e uma pedra, lhe fazem companhia. Com sua espada enferrujada em punho e sua armadura envelhecida, manchada de sangue e lama, o cavaleiro se despede de sua morte, ou o que restou de sua vida humana...

- Eis aqui o que sobrou deste velho cavaleiro! Apenas um corpo se esvaindo na solidão de um túmulo. Junto com sua velha carcaça se vão suas glórias e suas conquistas, e nada mais resta além deste cadáver oriundo.
Ah!! Sim, e sua cruz de chumbo, a cruz que tanto beijou quando travava suas batalhas. Quem foste tu cavaleiro? Um mercenário, um deus, ou um guerreiro? Porque teu semblante é tão triste?
Tivestes a vida de um glorioso rei sem se quer ser coroado.
Tivestes as mulheres mais belas e conhecestes os homens mais sábios.
Vós lutastes em Constantinopla e em nome da santa cruz, defendestes Jerusalém.
Tu protegestes os templários em teu castelo e desvendastes todos os mistérios, há muito escondido nos séculos.
O que mais de ti restou além deste semblante entretecido?
Que agora jazia neste túmulo esquecido.
Ao olhar meu corpo que agora descansa debaixo destas rochas, percebo que tudo que conquistei não foi nada além de uma doce ilusão.
Uma Quimera, uma doce e impetuosa Quimera.
Que levou até os confins da escuridão meu coração.
Nada conquistei além de batalhas sangrentas e morte.
Quantos corpos abati na bravura?
E ainda tinha orgulho em contá-los.
Os corpos deformados pela minha ímpia espada.
Ainda posso ouvir os choros e os gritos que atormentavam meus ouvidos naquele silêncio sagaz.
E quantas cruzes manchadas de sangue seguiam impuras no horizonte?
Ah! Quantas cruzes reluziam naqueles olhos mortos, erguidas por mãos santas e braços tortos. Quantos mortos foram mortos pela minha espada?
Quantas cabeças por mim foram cortadas?
Lembranças amargas me remetem á lucidez da mente, que nega e não mente minhas mentiras inegáveis.
Não adianta pedir perdão quando não há mais chão para se ajoelhar.
Não adianta mais chorar quando não se tem mais olhos para chorar.
Eis o que restou deste velho cavaleiro:
Apenas um fantasma.
Um fantasma atormentado pela feracidade de sua própria consciência.
Respire cadáver imundo, o cheiro que de ti brota.
Foi isto que restou de minhas glórias?
O cheiro fétido de tua carne apodrecida?
Oh! Cadáver infeliz, de que adiantou tanta cicatriz nesse coração apodrecido?
Se ao menos o tivesse preenchido com a sutileza de um outro amor.
O amor que de ti foi tirado pela ignorância de tuas próprias mãos.
Porque a deixaste morrer?
Tivestes medo quando era preciso  ter coragem.
Caístes nas armadilhas do destino entregando-te aos leões covardes.
Ela morreu de saudade, traída pelo silêncio de tua presença.
Onde vós estavas enquanto ela morria de desgosto?
Onde tu estavas cavaleiro valente?
Onde estava tua espada santificada? 


💙


Espelho das eras


Leões da Babilônia cercam os portões do paraíso
Enquanto Sodoma e Gomorra choram
E Alexandria distribui seus livros
Onde estão os profetas com seus pergaminhos?
E os espartanos com suas lanças de ouro?
Em cada árvore do Éden
Um pássaro faz seu ninho
Enquanto Atlântida desce
Nas profundezas de um mar revolto
E o Egito grita com a esfinge em seu ventre
Sangue e águas correntes
Á lacrimejar no Nilo
Elevam e ressuscitam as colunas de Atenas
Que choram no Egeu como lágrimas serenas
Enterrado na areia
Um cavalo de Tróia também chora
Ao lembrar dos olhos de Helena.


💙


A ira dos Metais


Talvez a ira dos metais caia sobre a terra.
Quando as lágrimas não puderem mais cair do nosso rosto
Uma esperança poderia vir junto com a chuva
Então levaria esse inferno embora
Que praga é pior que a maldade?
Por que as máscaras de ferro ainda insistem em governar este mundo?
Nem mesmo a pomba branca é capaz de abrir suas asas
Na esperança de ter um pouco de paz
Os oceanos choram suas lágrimas salgadas
Enquanto as montanhas de gelo deslizam sobre o seu pranto
Se a lua se for, o que acontecerá com as marés?
Se o sol não brilhar, quando chegará um novo amanhã?
O fogo está em toda parte.
Espalhando sua fúria
Há fogo nas florestas
Há fogo nas árvores.
Há fogo nas mãos de homens cruéis
Os ventos propagam as novas pestes
As lacunas se abrem no meio da terra.
Meu Deus!  Não há para onde correr
Há flechas lançadas no céu.
Mas não são flechas de esperança
Há angústia no coração das pessoas boas.
Há um grito que não cessa
Talvez se a fúria dos metais caísse na Terra
A cavalgada das Valquírias
Anunciasse a chegada dos Titãs
Que guerra não é má?
Se a guerra em si é uma guerra
Não há paraíso diante de nossos olhos.
Quando o inferno está tão perto de nós
O mundo é governado por corações de pedra
Quem é mais louco do que os próprios loucos?
Que loucura pode deixar seu Studien über Hyst?
As arenas espalhadas pelo mundo propagam suas maldades
As ruínas vêm antes das cinzas ou as cinzas vêm antes das ruínas?
O fogo que queima na terra não é o mesmo que sobe no céu.
Nem as mãos podem parar a fúria da natureza
Quando tudo ao nosso redor é fúria
Talvez a ira dos metais nos diga
Como ter um novo começo


💙


A flecha do tempo


 Meu peito se abre
 Na agonia da dor que eu sinto
 Por estar longe de você, meu amor
 Minhas mãos não são capazes de alcançar este céu
 Não consigo ver as estrelas que estão longe dos meus olhos cansados
 O intervalo de tempo abre cada vez que tenho que medir a distância que nos separa
 Não me faça sofrer, se você não quer sofrer
 Não me faça chorar, se você não quer chorar
 As regras de ouro não são válidas para quem se entrega ao amor.
 Nem minhas mãos bárbaras conseguem parar as lágrimas que caem do meu rosto.
 Mesmo minha coragem não pode me dar a coragem de parar de chorar.
 Um mar vermelho se abre no meu peito toda vez que meu coração sente você
 Eu sinto você como a brisa que brilha do mar
 Eu sinto você como a chuva que cai suavemente nas pétalas das flores
 Eu sinto você na noite em que chega.
 Eu sinto você no dia em que você acorda.
 Sempre que quero ver seu sorriso, olho para o sol e vejo você sorrindo para mim
 Quando penso em você, penso apenas em você e em sua presença constante
 Você está em mim como a semente está na terra.
 Você está em mim como o sal está no mar
 Você brilha em mim como os relâmpagos nas tempestades
 Você é parte de mim, e você está em mim, como as estrelas estão neste universo
 Dizer que não te amo é o mesmo que dizer que não estou vivo
 É você que me faz viver.
 É você que me faz sentir vivo.
 Quanto vale a vida se você não pode amar?
 Quando não estou com você, meu amor.
 Eu desço essas escadas tristes e frias do meu coração
 Enquanto a ampulheta do tempo me pega em suas asas
 Desço na imensidão desse âmbar e vejo lá embaixo as fontes de águas que nunca   bebi
 Vejo os corvos de Poe voando sob os jardins que um dia mantiveram meus       pensamentos
 Quando escuridão e sombra eram as mortalhas das minhas palavras
 O fosfenismo nos meus olhos me lembra que eu preciso voltar
 Então eu volto, antes que o tempo congele essa luz fluorescente
 Volto para você, meu amor, volto para seus braços
 Penso em tudo o que está aqui e percebo que você está sempre comigo
 Enquanto a vida, como um arco.
 Lança o tempo com sua flecha

💙


A poesia


Para escrever uma poesia basta estar vivo
com a alma acessa de esperança
Estar com o coração sorrindo tal qual uma criança
faceira e sorridente
E se uma lágrima brotar na fase carente
de amor, de vida, de gente
Clama-se por amor
Quem nunca chorou por amor?
Quem nunca sofreu por amar?
É o sentido da vida, o amor se sente no corpo
e na alma ferida, mas quando não se ama, a alma
não se entrega a jactância do amor
O amor está no gozo e no sorriso
no fogo brando da paixão, no paraíso
não existe vida sem amor, assim como não
existe poesia sem inspiração
e se uma lágrima virar uma estrela
então que se chore uma constelação
vale mais a pena chorar por amor
do que viver na solidão
Não há poeta que tenha vivido
sem questionar esta questão
é o que nos torna vivos
o que nos dá emoção
Somos trovadores
Pássaros de esperança
rasgando os céus da paixão
é o que diria Quintana
Machado e Drummond


O amor para os poetas
é como um oceano infinito
que transborda no coração dos amantes
é um jardim de rosas vermelhas
um céu coberto de diamantes
A poesia para os poetas é o sopro da vida
a luz da retina, é o corpo ardente de uma mulher
o sorriso de uma menina
Somos anjos, profetas, demônios
realizamos, prevemos, tentamos
somos cantores de amores
plantadores de flores
semeamos desejos, fantasias e cores
Sim, a poesia é colorida
mesmo sendo triste
a cor persiste
talvez seja a cor do amor
quem sabe?
Para o poeta nada é impossível
quando sua poesia expressa a verdade
é a paixão proibida, a dor da amargura
o vôo sem asas, a liberdade
é o sonhar sem dormir
o cessar da saudade
é o amor visto em um caleidoscópio de extrema beleza
é o que diria Queiroz, Neruda e Bandeira


Para aqueles que gostam da realidade a poesia é crua
para os que gostam da fantasia a poesia é nua
é o transbordar de palavras e misturas
A poesia é um sol radiante, dourado, bonito
é a conjugação do amor no verbo do infinito
é o som do silêncio, o brado do grito
é a vertigem dos vertiginosos
o abraço dos braços
o beijo dos lábios
o namoro dos enamorados
Para escrever uma poesia, basta ter certeza
de que o amor abrange as margens da alma
dando luz a clareza, calmaria a calma
é um jogo que se joga com o coração
impregnado de paixão
é a lança das ondas em um mar revolto
a luz do crepúsculo
a chama do fogo
o sentido da emoção
A poesia é o amor transcodificado em palavras
o berço dos carentes
o presente do ausente
a inspiração da vida seguindo sempre
é o que diria Castro Alves, Balzac e Shakespeare






💙















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