quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Sonetos Expurgos IX ✒📃 🎼






Cegueira alheia


Um homem faz suas escolhas
Mesmo sem ser escolhido
Como um corpo que já está morto
Sem ao menos ter morrido

A estrada é errada para alguns
E certa para outros
O sol só brilha para uns
E não para todos

Não existe igualdade na diversidade
Existe a sobrevivência pela própria existência
Não há cego que possa enxergar

Na escuridão da própria cegueira
Não há fome que possa cessar
A fome de quem tem sangue nas veias


🌷


Póstumas notas


Quantos prantos derramados por amor
Ela chorou em um só dia
Tentando se livrar daquela dor
Que á fazia sofrer na agonia

Rosas brancas foram colocadas no altar
Para enfeitar seu amor que ali jazia
E em cada pétala uma lágrima escorria
Pranteando junto com ela aquela sinfonia

O amor se vai com as pétalas de uma rosa
Que se despedaça como uma vidraça vistosa
Deixando seus cacos nos corações tristes

Que mesmo com tanta dor insistem
Em continuar sua jornada
É a força do amor que faz valer cada palavra


🌷


Estranhos vultos


Vejo os vultos passando á minha frente
São almas que já morreram
E acreditam que ainda são gente
Vivendo suas vidas mesquinhas

Tristes ou contentes
São fantasmas solitários
Á vagar pela imensidão
De uma vida de pecados e outra de perdão

A luz que eles deixaram não mais os conduz
Agora vivem assoberbados
Cada qual com sua cruz

Talvez eu também esteja morto
Como estes pobres coitados
E minha memória apenas reluz


🌷


Palavras dissolvidas


O poeta sangra quando escreve
Uma vertente de verdade
Mesmo quando escurece
Ofuscando a claridade

Palavras de amor
De dor e de saudade
São apenas palavras
Sobrepostas uma á outra

Que sangram sozinhas
No silêncio de suas sílabas
Palavras dissolvidas

No fervor da língua
Que afiada, fere e xinga
E eloquentemente grita


🌷



A louca fantasia de um peixe imaginário


Ela se abre argilosamente como uma rosa impetuosa
Que quando aberta queima mais que um fogo brando
Como se de longe me fosse aberto uma porta
Que entraria mesmo que fosse por engano

Fazendo-me mergulhar na límpida água de seu aquário
Seria eu então um peixe imaginário
A passear pelos seus corais, pelos quais
Me perderia em seus labirintos

Seria eu então um peixe feliz á sorrir com seus sorrisos
Á desbravar as profundezas profundas do teu mar
Ficar dentro de ti e sorrir até teu sorriso se esvair

E o amor te cobrir com o doce perfume de amar
Depois morreria em teus lábios após teus lábios beijar
E o que de mim sobraria depois desta fantasia? Acordar?


🌷


Expurgo


De mim foram tiradas as vísceras apodrecidas
Junto com as feridas de um mundo adoentado
Outrora envenenado pelos reis das províncias
E machucado pelos gigantes atormentados

Não há cura onde a real loucura predomina
O louco não consegue gritar quando a mente o domina
Restos são restos, e o que sobra para os insetos?
Que de longe chegam perto de nossa hegemonia

A insustentável razão de um ser humano incrédulo
Que com seu apego, apelo, apreço
Paga seu preço pela sua inevitável ignorância

Que desde a infância constrói seus castelos
E desenha sois amarelos
Desejando um dia ser feliz


🌷






💙




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